Presidente do CFMV alerta em artigo sobre importância da prevenção da leishmaniose
A recente aprovação de um medicamento contra a leishmaniose visceral canina (LVC) representa um grande avanço na luta contra a doença, mas a prevenção continua sendo a melhor forma de combate a essa zoonose. Em um artigo publicado neste mês na Revista Cães&Cia, o Presidente do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), Benedito Fortes de Arruda, lembra que o tratamento da LVC não é garantia de cura, e que um acompanhamento veterinário periódico é necessário para minimizar o risco de infecção aos humanos. Portanto, ainda é dever da população zelar contra a leishmaniose, evitando as condições que permitam a reprodução do inseto vetor, o flebotomíneo transmissor, além de proteger os cães com medidas como vacinas e repelentes.
Veja o artigo completo:
Prevenção da leishmaniose ainda deve ser o foco
Benedito Fortes de Arruda
Avanços na Medicina Veterinária continuam trazendo novas formas de controle a uma doença ainda negligenciada e de grande importância em saúde pública: a leishmaniose visceral (LV). Se antes a eutanásia era a única opção para todos os casos de diagnóstico positivo para a leishmaniose visceral canina (LVC), hoje é possível optar pelo tratamento do animal infectado. No entanto, essa alternativa não representa uma garantia de cura definitiva, nem pode ser interpretada como uma medida de saúde pública. Sendo a LV uma zoonose de transmissão vetorial, isto é, uma doença que é transmitida entre animais e humanos por meio da picada do vetor flebotomíneo, conhecido como mosquito-palha, é importante lembrar que a arma mais eficiente nessa batalha continua sendo a prevenção.
No Brasil, o tratamento de cães com LV é normatizado pela Portaria Interministerial nº 1426/2008, que proíbe o tratamento de LVC com produtos de uso humano ou não registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Até o ano passado, não havia no mercado nenhum medicamento que cumprisse com esses requerimentos, portanto o tratamento não era permitido no país. Mas, com o recente registro do primeiro fármaco de uso veterinário contra LVC no Brasil, agora é possível tratar animais infectados sem descumprir a legislação.
Ao se considerar essa opção, porém, o médico-veterinário e o responsável pelo animal de estimação devem visar alguns fatores importantes relacionados à LVC e sobre como o tratamento age no ciclo de transmissão da doença.
Como nenhum medicamento é capaz de eliminar a leishmânia por completo do organismo do animal infectado, os cães em tratamento devem ser monitorados e reavaliados clínica e laboratorialmente, conforme indicação da bula do medicamento para verificar se novos ciclos de tratamento são necessários. Isso significa que o tratamento aprovado pelo Mapa é capaz de atenuar a concentração da leishmânia no organismo do animal a ponto de diminuir a chance de transmissão do parasita para o inseto vetor, e também combatendo os sintomas da doença, mas essa ação exige constante cuidado e controle por parte do responsável pelo animal, além de uso permanente de coleira ou outras substâncias de efeito repelente e inseticida contra flebotomíneos.
Caso o proprietário decida tratar seu cão infectado, o animal terá de ser acompanhado pelo resto da vida por um médico-veterinário, que realizará exames para cumprir a necessidade de reavaliação clínica e laboratorial periódica. Dependendo do parecer do veterinário, o animal pode ter de passar por um novo ciclo de tratamento para manter a carga parasitária num nível considerado seguro. Arcar com os custos e com a responsabilidade desse tratamento é uma opção de caráter individual do cuidador, e que representa um sério compromisso de longo prazo.
Também é importante ressaltar que continua em vigor a Portaria Interministerial que proíbe o tratamento de LVC com produtos de uso humano ou não registrados no Mapa, portanto não é permitido o tratamento da LVC com outros produtos que tenham princípios ativos similares àquele registrado no Brasil para o tratamento da LV humana ou que tenham sido adquiridos de forma irregular no exterior. É permitido apenas o uso do produto autorizado para venda no país pelo Mapa, cuja legitimidade pode ser atestada por meio do número de rastreabilidade do medicamento.
É preciso considerar também que, como o cão infectado poderá não ter o parasita eliminado pelo tratamento, são recomendadas medidas como o uso de repelentes e inseticidas à base de piretroides, além da não exposição do animal em ambientes e horários de atividades do vetor, e da proteção dos canis, portas e janelas com telas adequadas para o tamanho do inseto vetor.
Mesmo os proprietários de animais de estimação saudáveis devem se atentar para a prevenção contra a LVC, protegendo o animal fazendo uso da vacina contra a leishmaniose visceral canina também registrada pelo Mapa e de coleiras ou outros produtos repelentes e inseticidas contra o vetor, como já mencionado, e por meio da limpeza de quintais e terrenos, a fim de evitar as condições que propiciam a presença e reprodução do transmissor da doença, o mosquito-palha. Para isso, é necessário dar destino adequado dos resíduos sólidos orgânicos e eliminar fontes de umidade.
O Brasil está na lista dos seis países mais afetados pela LV e, de acordo com dados do Ministério da Saúde, mais de 3 mil pessoas são acometidas pela doença e cerca de 200 morrem todos os anos no país devido a essa zoonose. Os cães são considerados o maior reservatório urbano da LV, mas não são eles os culpados por esses números. A responsabilidade na luta contra essa doença é da população e dos serviços públicos de saúde. A população tem o dever de atuar na prevenção e evitar a manutenção das condições favoráveis à presença do vetor em suas casas e entorno. Os serviços públicos de saúde, por sua vez, têm a obrigação de garantir a assistência necessária aos acometidos e de orientar a população sobre importância dessa zoonose com práticas de educação em saúde.
CFMV