Médicos veterinários realizam pesquisas e ações de educação ambiental para a prevenção da hanseníase no Brasil
A hanseníase, antigamente conhecida como lepra, é uma das doenças mais antigas do mundo. Ela é causada pela bactéria Mycobacterium leprae, capaz de infectar grande número de pessoas. O que muitos não sabem é que no Brasil, a doença ainda é bastante comum. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), nos últimos cinco anos, foram detectados novos casos da doença em 24 países nas Américas, sendo 94% das ocorrências registradas no Brasil.
A transmissão se dá de uma pessoa doente sem tratamento para outra, após um contato próximo e prolongado. Atualmente, pesquisas estão sendo feitas no Brasil por médicos veterinários que comprovem a hanseníase como uma zoonose, doença transmitida entre animais e humanos.
Nos Estados Unidos, o fato já foi comprovado, tendo sido confirmado que em 42,3% dos casos da doença, a mesma bactéria encontrada em tatus está em humanos contaminados com hanseníase. Enquanto que no Brasil, no estado do Espírito Santo, 90,4% dos pacientes relatam consumo de carne de tatu sem nunca ter contato com pacientes portadores da doença, o que sugere que os tatus podem ser a fonte de infecção para estas pessoas.
É o que afirma o médico veterinário João Marcelo Antunes, pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal e coordenador da Comissão de Residência Multiprofissional em Área Profissional da Saúde da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa), em Mossoró (RN).
“O tatu é o melhor meio para o crescimento dessa bactéria e se torna um reservatório em que o agente se multiplica dentro dele, podendo ser transmitido a outro animal, pessoa ou ao ambiente”, explica o médico veterinário.
Foto: Arquivo pessoal. Ascom/CFMV
Ele faz parte de um grupo de pesquisadores da Ufersa, em parceria com a Fiocruz e com a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, que busca comprovar a ligação entre pessoas contaminadas com hanseníase e tatus localizados em regiões endêmicas. “Dessa forma, o risco para consumidores de carne de tatu, especialmente resultantes da caça ilegal, se torna muito grande”, diz Antunes.
Ele alerta que a caça do animal é proibida e que as pessoas que têm contato direto com tatus podem contrair doenças graves, além da hanseníase. No Nordeste, entretanto, a caça e o consumo de animais silvestres, como o tatu, são culturais.
Outra doença comum que se dá na caça ilegal de tatus é a micose pulmonar. No estado do Piauí, já foram registrados mais de 100 casos em 40 municípios, segundo o integrante da Comissão Nacional de Meio Ambiente do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CNMA/CFMV), Fabiano Pessoa, que também é analista ambiental do Ibama no Piauí. A doença é transmitida por meio de um fungo presente no solo ou no animal que pode contaminar também os cães usados na caça do tatu e o próprio ser humano.
Educação Ambiental
João Marcelo ressalta o papel do médico veterinário nas pesquisas sobre o tema, ainda emergentes no Brasil. Também destaca a importância do profissional na educação ambiental e conscientização da população, especialmente das crianças. “É difícil mudar a cabeça de um adulto quando falamos de uma questão cultural, por isso a educação ambiental mais efetiva se dá por meios lúdicos, de forma pedagógica. É a nova geração que vai deixar o legado”, acredita.
Pensando em formas de evitar a transmissão de zoonoses e na exposição desnecessária das pessoas a fatores de risco, Fabiano Pessoa, em conjunto com o médico veterinário e seu colega no Ibama, Sandovaldo Moura, criaram o Projeto Liberdade e Saúde. A iniciativa nasceu com a ideia de trabalhar e discutir com a sociedade a questão do tráfico de animais, tendo como ferramenta principal a educação ambiental direcionada principalmente às crianças e aos professores.
O projeto existe desde 2006 e visa a formação de multiplicadores nas áreas de saúde pública. Entre as ações educativas, estão gibis e vídeos musicais no YouTube. As músicas falam do sofrimento dos animais escravizados pelos traficantes e contrabandistas, sendo um deles específico sobre o tatu.
Ao completar 10 anos, o projeto já havia sensibilizado mais de 4 mil professores, nas áreas de meio ambiente e saúde.
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CFMV (acesso em 03/10/17)