Dia das Crianças: adotar um animal é coisa séria e exige planejamento
O abandono de animais no Brasil tem números alarmantes. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, há mais de 20 milhões de cães e mais de 10 milhões de gatos abandonados no País. E a falta de conscientização quanto à guarda responsável está no cerne dessa questão.
Em algumas datas comemorativas, como o Dia das Crianças, é comum famílias presentearem os pequenos com pets. O problema é que, na maioria dos casos, é um ato impulsivo, que resulta em abandono nas ruas ou devolução ao abrigo ou canil de origem. “A adoção de um animal é um ato admirável de amor. O único problema é a falta de planejamento familiar antes de adotar ou até mesmo comprar um animalzinho, que é um ser vivo e depende das pessoas para sobreviver”, afirma o médico-veterinário Thomas Faria Marzano, presidente da Comissão Técnica de Clínicos de Pequenos Animais do CRMV-SP.
Marzano destaca que devem ser levados em conta, entre outras coisas, a rotina e o estilo de vida da família, quem cuidará da limpeza e da alimentação dele e a até mesmo a quantidade de pets que já existem na casa.
De acordo com a médica-veterinária Cristiane Schilbach Pizzutto, presidente da Comissão Técnica de Bem-estar Animal do CRMV-SP, existem diversos aspectos a serem considerados antes da introdução de um pet na família, entretanto o mais importante é serem atendidas as necessidades do animal. “A pessoa tem um espaço adequado para o animal fazer exercícios, conhece as necessidades de alimentação e de passeios diários, no caso de cachorro? A família deve estar ciente também com relação à boa prática de manejo e de higiene. É preciso lembrar de que os cuidados continuam depois que passa o momento de euforia da chegada do animal na casa”, enfatiza.
A médica-veterinária alerta para o fato de que a guarda responsável e o bem-estar dos animais são fundamentais, portanto é preciso que as campanhas de conscientização sejam intensificadas. “Animais não são objetos e não podem ser tratados como tal. Por isso, não se deve presentear alguém com um animal como se isso não fosse trazer conseqüências, como despesas e a necessidade de se dispor de tempo. Se a família não estiver preparada, certamente, terá problemas.”
Seres sencientes
Um projeto de lei, recentemente aprovado no Senado, reconheceu os animais como seres sencientes, ou seja, capazes de sentir e vivenciar sentimentos como alegria, dor, angústia, raiva e solidão. Diante desse fato, a conscientização sobre guarda responsável é ainda mais relevante. “A devolução ou simplesmente o abandono causam um desequilíbrio no animal. Ele sente a perda da família e, em alguns casos, acaba ficando sem vontade de se alimentar ou brincar, podendo até ficar doente”, ressalta Marzano.
Para Cristiane, é preciso entender que a senciência é a capacidade que o animal tem de sentir todos os estímulos que estão à sua volta e desencadeiam respostas determinadas. “A influência da devolução é muito ruim. Um animal adotado que depois é devolvido pode desenvolver agressividade e, futuramente, pode se tornar amedrontado, envolvendo até um quadro depressivo.”
Por isso, o ambiente deve ser muito bem preparado para cada espécie. A casa de quem tem um gato é totalmente diferente daquela de quem tem um cachorro. É muito importante que essa família consulte um profissional e se informe das necessidades desses animais antes de adquiri-los.
Cães e gatos exigem cuidados completamente diferentes e que vão exigir níveis diferentes de atenção. “É possível ter uma família multiespécie, desde que haja manejo específico para o gato e o cachorro, porque vai encadear respostas comportamentais”, afirma Cristiane, destacando que, hoje, existem muitos animais com problemas de comportamento em decorrência da postura da família.
Nada de humanizar seu pet
A convivência entre crianças e animais é muito positiva, mas são comuns casos em que há a humanização do pet. Segundo a médica-veterinária Cristiane Pizzutto, não há problema em considerar o animal membro da família, o vínculo entre tutor e pet é muito importante, mas o que não podemos fazer é descaracterizá-los como espécie.
“Sou absolutamente contra o antropomorfismo, que é a pessoa transferir para o animal a figura humana, colocar sapato, levar para passear em carrinho de bebê. O vínculo que considero essencial é a convivência e a interação do tutor com o animal: levar para passear, colocar a comida, cuidar, preparar o ambiente para ele ficar, e educar. Cuidar bem é respeitar a espécie, suas necessidades e características”, enfatiza, lembrando que se o tutor tiver um jardim, por exemplo, deve deixar seu cachorro cavar e enterrar comida, pois isso é parte de seu comportamento natural.
Thomas Marzano também concorda que o carinho gerado entre crianças e animais é comprovadamente favorável. “O animal é um ser dependente que necessita de carinho e atenção, mas, muitas vezes, observo que esse amor passa dos limites, tornando-se deletério ao animal. Um exemplo disso é transformar cães e gatos em vegetarianos, o que foge da natureza deles e pode causar inúmeras doenças nutricionais. Nunca esqueça que o animal adotado deve ter acompanhamento veterinário, desde o momento da adoção e, pelo menos, uma vez por ano”.
Perguntas que você deve responder antes de, efetivamente, adotar um pet:
O que espera de um animal?
Dispõe de espaço e ambiente adequados para o animal em sua casa?
Quem cuidará da rotina do pet?
Cabem em seu orçamento os cuidados com alimentação, higiene, visitas ao médico-veterinário, vacinações e medicamentos?
Sabe qual espécie melhor se encaixa em sua rotina?
Tem condições de despender de tempo para interagir, passear e levar ao médico-veterinário?
Caso tenha outro pet em casa, conseguirá manter mais um?