Está no Diário Oficial da União (DOU) de hoje (29), a Resolução do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV) nº 1.465/2022, que regulamenta o uso da telemedicina veterinária nas atividades médico-veterinárias. A prática é permitida aos médicos-veterinários com inscrição ativa no Sistema CFMV/CRMVs e às pessoas jurídicas devidamente registradas com Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) de um profissional regularmente inscrito.
A norma define que a telemedicina veterinária é o exercício profissional por meio do uso de tecnologias de informação e comunicação (TICs) para prestar assistência, observando padrões técnicos e condutas éticas aderentes às resoluções editadas pelo CFMV. O profissional pode desenvolver aplicativo específico para a telemedicina ou fazer o uso integrado de plataformas existentes, desde que respeitados os critérios e as garantias estabelecidos na resolução, registrando em prontuário a tecnologia empregada no atendimento.
A resolução dispõe que o atendimento presencial é o padrão-ouro para a prática dos atos médico-veterinários e assegura ao profissional a autonomia de decisão quanto ao uso da telemedicina veterinária, inclusive sobre a sua impossibilidade. O profissional deverá decidir com livre arbítrio e responsabilidade se as informações recebidas são qualificadas dentro de condições éticas e de protocolos de segurança digital suficientes para a realização do ato médico-veterinário por meio da telemedicina.
O profissional deve sempre considerar os benefícios para o paciente, informar ao responsável todas as limitações inerentes ao atendimento remoto e garantir ao representante legal o recebimento de cópia digital ou impressa dos dados referentes ao registro do atendimento realizado virtualmente. Assim como na consulta presencial, o médico-veterinário é responsável pelos atos praticados na telemedicina, devendo seguir as condutas do Código de Ética, estabelecidas na Resolução CFMV nº 1138/2016.
Modalidades
Dentro da telemedicina veterinária estão incluídas as modalidades de teleconsulta, telemonitoramento, teletriagem, teleorientação, teleinterconsulta e telediagnóstico.
A teleconsulta é a modalidade para realizar consulta médico-veterinária a distância, por meio de TICs, nos casos em que o médico-veterinário e o paciente não estejam localizados em um mesmo ambiente geográfico. Ela não é permitida nos casos de emergência (inciso IV, art. 4º da resolução) e urgência (inciso V, art. 4º), e somente pode ser efetivada nos casos de Relação Prévia Veterinária-Animal-Responsável (RPVAR) que tenha sido presencial e devidamente registrada.
Nos atendimentos de animais de produção, faz-se necessário ainda o conhecimento prévio da propriedade, haja vista as particularidades relacionadas a manejo sanitário, sistema de criação, situação epidemiológica, histórico sanitário, características do rebanho, clima e topografia.
Antes da teleconsulta, a RPVAR precisa ser validada pelo profissional com a conferência dos dados cadastrais e das características do paciente, bem como das informações do responsável. Em casos de desastres, naturais ou não, a relação prévia é excepcionalmente dispensada em virtude de danos, ameaças ou obstáculos que impossibilitem o deslocamento do paciente e de seu responsável e inviabilizem a consulta presencial.
A teletriagem, por sua vez, é destinada à identificação e classificação de situações que, a critério do médico-veterinário, indiquem a possibilidade da teleconsulta ou a necessidade de atendimento presencial, imediato ou agendado. Já teleorientação é destinada à orientação médico-veterinária geral e inicial a distância. Pode, por exemplo, a depender o caso, virar uma teletriagem, com a indicação para procurar uma clínica/hospital veterinário, ou agendar atendimento com um especialista.
De qualquer forma, para as duas modalidades, é vedada qualquer tipo de definição diagnóstica, conduta terapêutica, solicitação de exames ou qualquer prescrição. Antes de iniciar atendimento nessas modalidades, o profissional deve deixar claro ao responsável pelo paciente que não se trata de consulta médico-veterinária virtual.
Há também a definição de telemonitoramento, também conhecido como televigilância ou monitoramento remoto. Destina-se ao acompanhamento contínuo de parâmetros fisiológicos, realizado sob orientação e supervisão médico-veterinária, para monitoramento ou vigilância a distância das condições de saúde e/ou doença.
É permitido em três situações: quando já foi realizado atendimento presencial anterior; durante a recuperação de procedimento clínico ou cirúrgico para o devido acompanhamento; ou nos casos de tratamento de doenças crônicas. Nesse último caso, há exigência de consulta presencial com o médico-veterinário assistente do paciente a cada 180 dias.
A teleinterconsulta médico-veterinária é a modalidade realizada exclusivamente entre médicos-veterinários para troca de informações e opiniões com a finalidade de promover o auxílio diagnóstico ou terapêutico. Prática que já é comum, porém, sem uma regulamentação específica.
Nessa modalidade, a informação deve ser transmitida eletronicamente ao profissional que está localizado remotamente; a partir da qualidade e da quantidade de informações recebidas, ele deve decidir se pode oferecer sua opinião de forma segura. A responsabilidade do atendimento cabe ao médico-veterinário que assiste o animal presencialmente, porém os demais profissionais envolvidos também poderão responder na medida de suas atuações.
Já telediagnóstico médico-veterinário é a modalidade com finalidade de transmissão de dados e imagens para serem interpretados a distância entre médicos-veterinários, com o objetivo de emissão de laudo ou parecer com assinatura eletrônica avançada (inciso XII, art. 4º).
Sempre que houver necessidade de compartilhamento de informações, o médico-veterinário deverá submeter um Termo de Consentimento para Telemedicina Veterinária ao responsável pelo paciente para assinatura eletrônica.
Prescrição
A prescrição veterinária a distância decorrente de teleconsulta ou telemonitoramento deverá conter, obrigatoriamente, identificação do médico-veterinário, incluindo nome, CRMV, telefone e endereço físico e/ou eletrônico; identificação e dados do paciente e do responsável; registro de data e hora do atendimento; e uso de assinatura eletrônica avançada (inciso XII, art. 4º) ou qualificada (inciso XIII art. 4º) para emissão de receitas e demais documentos.
Os receituários de medicamentos sujeitos a controle especial somente serão válidos quando subscritos com assinatura eletrônica qualificada (que utiliza certificado digital), assim como devem seguir as normas editadas pelos órgãos e entidades reguladores específicos, como os Ministérios da Saúde (MS) e da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Segurança
Para a realização da telemedicina veterinária devem ser preservados os direitos individuais dos responsáveis pelos pacientes, garantindo a integridade, a segurança, o sigilo e a fidelidade das informações. São princípios também a serem observados nos documentos médicos-veterinários eventualmente assinados a distância, assegurando a autenticidade das informações, de modo que qualquer modificação posterior seja detectada.
Deve ser preservado o conjunto de informações, sinais e imagens registrados na assistência médico-veterinária prestada, as quais integram o prontuário do paciente. A guarda das informações relacionadas aos serviços realizados por meio da telemedicina veterinária deverá atender à legislação vigente e estará sob a responsabilidade do médico-veterinário ou do estabelecimento.
Histórico
Por ocasião da pandemia covid-19 e do isolamento social imposto pela disseminação do vírus SARS-CoV-2, em 2020 o CFMV percebeu a necessidade de estimular o debate sobre a telemedicina veterinária e instituiu um Grupo de Trabalho (GT) para mapear as possíveis ações de regulamentação da profissão, inclusive dos serviços veterinários mediados por tecnologia.
Após três meses e meio de trabalho, com análises de mercado e consultas às legislações nacionais e internacionais nas medicinas humana e Veterinária, o GT apresentou a primeira minuta de resolução, com conceitos e critérios para a prática da telemedicina na prestação de serviços médico-veterinários.
Consulta pública
Em maio de 2021, a proposta de resolução foi submetida à consulta pública dos conselhos regionais (Ofício Circular nº 35/2021), uma vez que os diretores e conselheiros dos CRMVs são os representantes legalmente eleitos diretamente pelos profissionais de cada estado.
As considerações dos representantes dos profissionais foram compiladas, o texto passou por uma segunda fase de consulta, dessa vez apreciada pela Câmara Técnica de Medicina Veterinária do CFMV constituída à época, entre agosto e outubro de 2021. Os representantes se manifestaram e a nova versão de resolução foi submetida à análise técnica do Grupo de Trabalho Técnico-Jurídico (GTTJ), logo no início de 2022.
A quarta rodada de consulta pública da minuta de resolução da telemedicina veterinária ocorreu em março de 2022, durante a 1º Câmara Nacional de Presidentes, realizada Belém (PA). Os presidentes dos CRMVs foram organizados em grupos e tiveram a oportunidade de debater a minuta, propor ajustes e contribuir para a melhoria do texto.
Após um ano e nove meses de pesquisas e consultas, a proposta de resolução foi submetida à votação durante a 359ª Sessão Plenária Ordinária, em junho de 2022, quando foi aprovada por unanimidade, considerando os subsídios recebidos.
Conselho Federal de Medicina Veterinária